terça-feira, 31 de agosto de 2010

Zlatá ulièka ("Golden Lane" em obras)

Praga, 2010

"Um dia de Verão, fui com Ottla procurar casa; embora já não acreditasse na possibilidade dum sossego verdadeiro, pelo menos fui à procura dele… E nada, a bem dizer, não encontrámos nada. Mas depois, mais para nosso divertimento, perguntámos naquela minúscula ruela. E responderam-nos que sim, que haveria uma casa para alugar a partir de Novembro. Ottla, que também busca o sossego, mesmo que seja à maneira dela, apaixonou-se pela ideia de alugar a casa…"

Franz Kafka

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Um dia vulgar

Num dia como hoje, o olhar esquece que é visto e demora-se nas Fachadas de todas as Outras casas.
Num dia como hoje, há uma imagem vazia no forro da Consciência.
Num dia como hoje, uma mão Antiga, amiga, já cansada de esperar, toca de Leve no ombro, e lembra que há que andar.
Num dia como hoje, volta-se então a cabeça, muito, muito Devagar. A boca fria e imóvel, não lhe apetece falar.
Num dia como hoje, só os olhos se sorriem e Agasalham a esperança que tudo há-de mudar.
Num dia como hoje, aceita-se a tal mão amiga, deixa-se de olhar as fachadas, vai-se devagar Rua acima,
...porque é um dia vulgar.

O que se ouve por aí...

Se o conhecimento é filho da experiência, então ele chega sempre tarde demais.

O capelão da prisão...em interpretação livre

Praga 2010

Estava quase a deixar a parte da igreja ocupada pelos bancos e a aproximar-se já do espaço livre que lhe faltava percorrer para atingir a saída, quando, pela primeira vez , ouviu a voz do padre. Era uma voz poderosa, educada. Como ela ressoou então pela catedral pronta a recebê-la! Não eram os fiéis que o padre chamava, as palavras eram inequívocas e não admitiam subterfúgios, o padre chamara: Josef K!
(...)
_ És Josef K_ disse o padre , levantando a mão por cima do parapeito num gesto vago.
_ Sim_ volveu K...
_ És acusado...

Franz Kafka, O Processo

Nossa Senhora de Týn

Praga 2010

K. sentia-se um pouco desamparado à medida que, talvez observado pelo padre, avançava sozinho por entre os bancos vazios; as dimensões da catedral pareciam-lhe estar precisamente na fronteira do que era suportável pelo homem.

Franz Kafka, O Processo

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Leituras cruzadas

Para falar tem de se começar a falar. Em geral é pelo mesmo. Há uma urgência em saber o nome e a ocupação da pessoa que pela primeira vez encontramos porque se tem pavor do indefinido. Como se se ficasse a saber alguma coisa.

Pedro Paixão, Imagens proibidas

Zur Minute

Praga 2010

As primeiras recordações explícitas de Kafka estão associadas à Casa do Minuto. Aqui passou parte da infância e os primórdios da adolescência. São deste período as memórias relatadas a Milena e algumas entradas nos Diários, nomeadamente o episódio da mulher pedinte e as impressões causadas por uma certa cozinheira impiedosa que o conduzia à escola e que lhe chamava "Pequeno Ravachol". Relatos reveladores de uma extrema sensibilidade e de uma precoce preocupação pelo "comportamento adequado".

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A cidade de Josef K.

Praga 2010

Praga exerce sobre Kafka um enorme poder simbólico: existencialmente enclausurante nega-lhe, ao mesmo tempo, os seus segredos e a participação. A segregação acontece no interior do círculo.
Com Josef K., acusado e culpado, rastejamos na cidade e obrigamo-nos a um registo sensorial pouco usual, donde emerge a ambígua relação entre a cidade real e a cidade imaginada: a que construiu e formou Kafka na confluência da cultura germânica e judaica, por um lado, e a que informa a literatura do autor, saída do sentimento de rejeição e inadaptação, por outro.
É a Praga literária, ficcionada, sombra de sombras, a paixão que mais consome Kafka. Não é uma cidade, é uma fissura..., dirá ao seu amigo Gustav Janouch.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010